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Identificando o perigo


 

Robert Lifton diz que enfrentamos atualmente uma epidemia mundial de totalismo e de fundamentalismo na política e no mundo da fé, mas podemos identificar os cultos destrutivos por suas três características:

   1.  A existência de um líder carismático que se torna cada vez mais objeto de adoração e princípios gerais que lhe conferem poder;

   2.  A prática de um processo de persuasão coercitiva ou reforma do pensamento;

   3.  A exploração econômica ou sexual dos membros do grupo pelos líderes e o círculo dirigente.

Todas as três características estão presentes na Sukyô Mahikari, mas é importante observar como a persuasão coercitiva ou controle da mente é exercida nela, com base nos 8 métodos descritos pelo psiquiatra americano:

 

1. Controle  do meio

É o  controle de toda a comunicação dentro de um determinado ambiente, através de uma pressão psicológica contínua, isolamento pela distância geográfica, indisponibilidade de transporte ou mesmo limitação física. Muitas vezes, o grupo cria uma seqüência cada vez mais intensa de eventos como seminários, palestras e encontros que dificultam o distanciamento, tanto físico quanto psicológico. O controle intenso do meio pode contribuir para uma mudança dramática de identidade chamada duplicação: a formação de um segundo eu, que vive lado a lado com o anterior, muitas vezes por um tempo considerável.

Na Sûkyô Mahikari: O seminário básico é realizado em um ambiente místico, precedido de rituais e mantras estranhos, onde um grande número de informações e dados é bombardeado na mente dos assistentes,por longas horas, com pouco tempo para intervalo e refeição, induzindo o auditório ao cansaço mental e físico, deixando-o emocionalmente vulnerável e propenso ao controle. Tal método é justificado com a explicação de que o seminário da Mahikari difere de quaisquer outros seminários, sendo mais importante ficar imerso no banho de luz divina por três dias, mesmo que o ouvinte venha a cochilar ou não estiver entendendo a transmissão.

O Shinga-dai (centro de treinamento), onde fiz o treinamento, fica em Takayama, em uma área isolada, a 3 km da estação ferroviária mais próxima. Lá, os jovens aspirantes a orientadores são confinados por um período de 1 ano, sem nenhum contato com o mundo exterior e submetidos à toda a sorte de privações e humilhações, em nome do treinamento.

 

2. Criação de um peão


A segunda característica do ambiente totalista é a manipulação mística ou espontaneidade planejada. É um processo sistemático através do qual a liderança pode criar nos membros do culto a psicologia do peão. O processo é gerenciado de forma a parecer espontâneo e o seu objeto (membro) raramente se sente manipulado. Técnicas religiosas como o jejum, entoação de cânticos, preces e mantras são usadas.

Este tipo de  manipulação pode assumir uma forma  intensa em cultos onde um ser humano especial escolhido é a única fonte de salvação. Esse líder especial pode atrair membros para o culto, mas também pode ser uma fonte de crença errada. Se os membros do culto souberem que o seu fundador está associado à algumas práticas suspeitas eles podem perder a  própria fé. A manipulação mística também pode legitimar a enganação de pessoas de fora, que não conhecem a luz e vivem no reino do mal, podendo, portanto, ser  justificadamente enganadas por um propósito maior.

 

Na Sûkyô Mahikari: No seminário básico é enfatizada a importância de se praticar a imposição de mão, cuja lógica ou técnica não é explanada suficientemente, com ênfase nos efeitos espirituais que serão obtidos, como a remoção do turvamento e perturbação espirituais, que seriam a causa das infelicidades. Implanta-se o medo, subrepticiamente, na mente dos assistentes, diante da possibilidade de sofrer as consequências, caso deixe a seita.

Como resultado, o kumitê deixa de questionar as contradições das orientações ou mazelas comportamentais dos dirigentes, já que fica destituído da capacidade de auto-crítica e passa a agir como um animal domesticado, devotando a vida no “desencaminhamento” de terceiros. Nesse processo, mesmo a mentira torna-se válida, já que é dita em nome da causa divina.

O Mahikari-tai no Japão é instruído a agir dentro das universidades sob a fachada de LH Amigos Yokôshi, em vez de Sûkyô Mahikari, devido às suspeitas que poderiam ser levantadas.

 O otamagushi, uma forma de oblação para apagar o débito de vidas passadas e que era feita em nome dos antepassados, teve que passar a ser assinada pelo próprio kumitê, como medida de justificativa contábil, explicada, entretanto, como uma condição espiritual. Apesar desses procedimentos de ocultação da verdade, os seguidores não questionam, demonstrando uma obediência bovina.

 

3. Exigência de pureza

A procura da pureza é um apelo para a separação radical do bem e do mal dentro da entidade e dentro da própria pessoa. A purificação é um processo contínuo, muitas vezes institucionalizada dentro dos cultos de confissão, o que reforça a conformação, através da culpa e da vergonha evocadas pela crítica mútua e auto-crítica em pequenos grupos.

Na Sûkyô Mahikari: A cosmologia mahikariana fundamenta-se na existência do carma ou pecados cometidos nas vidas anteriores, causa de todos os fenômenos de infelicidade na vida presente, como a doença, miséria, conflitos e tragédias. O carma é definido também como a impureza que encobre o espírito individual, cuja remoção só é possível através da luz do Criador, o Deus SU da Mahikari, irradiada sob a forma de okiyome (purificação). Não existindo nenhum medidor do grau de pureza, o kumitê fica condicionado a receber e aplicar o okiyome para sempre, pagando para isso.


4. Confissão​

A confissão contêm uma mistura variada de revelação e ocultação. Como Albert Camus observou, "os autores das confissões escrevem especialmente para evitar a confissão, para não contar o que eles sabem." Confissões repetitivas, especialmente em reuniões programadas, muitas vezes expressam arrogância em nome da humildade.  Esse tipo de atitude revela uma índole não declarada, mas que pode ser expressada em frases ocultas/embutidas como: "Eu professo a penitência para ser capaz de acabar como  juiz" e "Quanto mais eu me acuso, mais eu terei o direito de julgá-lo."

Na Sûkyô Mahikari: A confissão dos pecados cometidos toma a forma de admissão dos erros praticados nas vidas passadas e que ocorre sob a forma de manifestação espiritual (auto-sugestionada) ou pela associação de quaisquer ocorrências consideradas negativas, como doenças e acidentes sofridos pelo kumitê. Este tipo de fenômeno ou raciocínio proporciona também uma espécie de catarse ou alívio ao membro, que se sente no controle das situações normalmente imprevisíveis e inevitáveis da vida, fazendo-o, ao mesmo tempo, identificar-se, mesmo inconscientemente, com o Oshienushi Primeiro (Sukuinushi-Sama), que declarava ser o mais impuro ou carmático de toda a humanidade, conferindo-lhe, por extensão, o direito de analisar e julgar os outros membros.

 

5. Ciência sagrada

A pretensão de ser científica é muitas vezes necessária para ganhar plausibilidade e influência na era moderna. A Igreja da Unificação é o exemplo da tendência contemporânea em combinar princípios religiosos dogmáticos com um pseudo-conhecimento científico sobre o comportamento humano e psicologia.

Na Sûkyô Mahikari: Dentro da apostila do seminário básico existem referências sobre a ciência humana, considerando-a algo material e virtual, incapaz de comprovar a existência da luz divina de altíssima dimensão. Esse tipo de abordagem, repetida em diversas ocasiões, cria uma espécie de expectativa na mente dos kumitê e confere ao ensinamento uma aura de exclusividade e superioridade, mesmo que na prática ocorra uma visível contradição, como na realização dos chamados testes de comprovação da existência da luz divina, com aplicação de okiyome(purificação) em cigarros e bebidas alcóolicas, para reduzir o teor de nicotina ou suavizar o sabor.

 

6. Leitura da linguagem

Refere-se ao literalismo e à tendência de endeusar as palavras ou imagens.  Uma linguagem simplificada, cheia de clichês,  pode exercer uma força psicológica enorme, reduzindo todas as questões de uma vida complicada à um  único conjunto de slogans, que são ditos para encarnar a verdade como uma totalidade.

 

Na Sûkyô Mahikari: Além do conceito de Kotodama (que foi mudado, inexplicavelmente, para Kototama), pelo qual as palavras ou sílabas possuem um significado ou força espiritual, justificando-se assim a obrigatoriedade de recitar, em japonês, as orações principais, a entidade faz uso hábil do sistema de trocadilho, mistificando certas palavras, como o «inteli(de inteligente ou intelectual)» transformado em in (ying=negativo) + teli (de terasu (iluminar, irradiar))= pessoa que irradia negatividade, ou «gakumon(aprendizado)», transformado em ga (eu) + kumon (padecimento)= o aprendizado no mundo humano resulta em sofrimento. O desprezo pela inteligência e conhecimento humanos, pregados na Mahikari, pressupõe, assim, um ardil para impedir uma análise mais acurada e racional do seu dogma, que acabaria revelando as suas contradições.

 

7. Doutrina acima da  pessoa

É invocada quando os membros da seita sentem conflito entre o que eles estão vivenciando e o que o dogma diz que eles devem vivenciar. A mensagem subliminar do ambiente totalista é a de que a experiência pessoal deve ser negada em nome da verdade do dogma. As contradições vêm a ser associadas com a culpa: as dúvidas indicam uma deficiência pessoal ou a presença do próprio mal.

Na Sûkyô Mahikari:  No primeiro dia da transmissão do seminário básico é fortemente recomendado aos assistentes deixarem de lado as idéias pré-concebidas, pensamentos e valores individuais, com o uso da metáfora do bule (mente do seminarista) cheio de café do dia anterior (conhecimento previamente adquirido), que impede a colocação do café saboroso (dogma mahikariano), feito na hora. Embora pareça fazer sentido, a sugestão esconde, na verdade, uma manobra para facilitar a ação subliminar e impedir quaisquer impulsos de questionamento ou dúvida, que poderiam colocar em risco a aparente lógica dos ensinamentos.

A única leitura recomendada é a das publicações da entidade, sendo a Internet considerada como uma ferramenta do demônio. Desde o início procura-se implantar na mente do kumitê o absolutismo do Oshienushi, cujas ações e palavras seriam incontestáveis, dada a natureza divina da sua missão, de tal significado que os kumitê são obrigados a aceitar proposições absurdas como o de acatar a ordem de considerar os corvos brancos, se assim for determinado pelo grão-mestre.​

 

8. Dispensa da existência

Esta talvez seja a mais significativa característica do movimento totalista.  Aqueles que não conheceram a luz e a verdade estão unidos ao mal, estão contaminados e, em certo sentido, geralmente metafórico, não têm o  direito de existir.

É a razão pela qual o membro da seita, ameaçado de ser lançado nas trevas exteriores, pode experimentar o medo de extinção ou colapso. Em condições particularmente malignas, a dispensa da existência é tomada literalmente, como na União Soviética, Alemanha nazista e em outros lugares, onde as pessoas foram condenadas à morte por alegadas deficiencias doutrinárias.

Na Sûkyô Mahikari: O conceito de tanebito (homens-sementes da vindoura civilização celestial) e de verdadeiros levitas (ajudantes de sacerdotes, segundo a Bíblia) são de tal modo incutidos nas mentes dos kumitê que a maioria acaba por acreditar ter sido selecionada e, de «braços dados com Deus» trabalhar na salvação da humanidade. Ocorre que, nessa cruzada em nome da purificação, os kumitê, instigados pelos dirigentes, não apenas chamam a todos aqueles que se recusam a fazer parte do esquema, «espiritualmente perturbados» e «não Sunao (desobedientes ao Deus SU)», como chegam ao extremo de considerar a morte por doença, acidente ou suicídio de algum kumitê, um merecimento, senão consequência natural do seu passado espiritual.

 

 

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